RESENHA DE “AFTERSUN” POR MARIA KATHARINA
Foi proposto no dia 03/03 pelo professor Kayron, responsável pela eletiva de Linguagem e cinema, o filme Aftersun dirigido por Charlotte Wells. Na sexta do dia 17, foi realizado um debate sobre o filme que dividiu opiniões, muitos odiaram e criticaram o enredo e alguns gostaram por se identificarem, agora eis a questão, o que contém o filme que gerou tanto alvoroço e descontentamento ?
O enredo gira em torno de uma viagem de férias comum de uma garota chamada Sophie ( interpretada por Frankie Corio ) e seu pai Calum ( interpretado por Paul Mescal ), com pessoas comuns e com problemas comuns. Em questão de “ inovação “ e impacto realmente não é o ponto forte do longa-metragem, porém apesar desta característica eu não o julgaria como ruim. Aftersun não é só uma obra de arte, é um sentimento, é uma experiência. A cinematografia do filme faz tudo valer a pena, a forma como a produção teve o cuidado de passar o que as personagens estavam sentindo sem precisar de um diálogo, como a coloração e a edição a todo momento demonstravam como ambos tinham realidades completamente diferentes, enquanto Sophie ( que estava entrando na adolescência ) não se sentia parte de algo, como se não pertencesse a lugar algum, Calum lutava contra a depressão e tentava a todo momento compensar o fato de que ele era um pai ausente e não conhecia a própria filha, como na cena do polo aquático que ele tenta fazer ela se divertir com algo que ele julga como entretenimento mas acaba a deixando ainda mais sozinha na piscina, e novamente ela não pertence a algo.
Seguindo a perspectiva de Sophie, é possível perceber que ao decorrer do filme ela encontra e socializa com grupos sociais distintos e de idades distintas, ela tem o pai como primeiro contato, e tenta se encaixar na vida dele na tentativa de se dar bem com ele, até porque ela já não tem um relacionamento muito bom com a mãe. Pelo figurino é perceptível a diferença das roupas e penteados dela com o pai e com o grupo de jovens que ela conhece ao longo da viagem. Com o pai ela está sempre com roupas mais “ masculinas “, de boné, shorts e blusas largas, porém com o grupo de adolescentes ela tenta parecer o mais feminina o possível, como quando ela escolhe ficar de biquíni e saída de praia porque está no mesmo ambiente que eles, ela tenta copiar as garotas mais velhas do grupinho, e ainda puxando para a filmagem, um detalhe muito sutil porém que comprova perfeitamente como ela quer se encaixar ali naquele ambiente é na cena dos adolescentes bebendo ( que ela foi ao encontro deles após o pai a deixar sozinha depois do karaokê ) se prestarmos atenção dá para perceber que a Sophie está com o mesmo penteado que a garota, mais velha do que ela, que está sentada à sua frente, porém minutos atrás com o pai ela não estava assim. Então seguindo esse ponto de vista é coerente dizer que mesmo sem estarmos escutando os pensamentos da menina, ainda assim é possível decifrar seus sentimentos.
Entretanto Calum, pai da personagem principal, também passa por seus próprios problemas. Com a sensação de que ele não tem propósito e sua vida não lhe traz felicidade é apresentado aos poucos ao longo da história que ele está em um estado de depressão profunda, em que ele não imagina mais um futuro para si mesmo, e que aquela viagem é uma possível recompensa por todos os momentos em que ele não se fez presente na vida da filha. Um dia após ele a ter deixado sozinha pelo hotel ( após o karaokê ), e a feito pedir uma cópia da chave do quarto na madrugada, porque ele havia desmaiado por conta de uma crise de ansiedade, era o dia de seu aniversário, os dois vão a um passeio para uma montanha onde se dizia ser o lugar onde uma cleópatra já havia vivido. Quando Sophie cita que a morte da cleópatra possa ter sido suicídio, a conversa que antes se fazia presente agora havia acabado, Calum se cala e alguns segundos depois pergunta repetidamente a Sophie se ela o desculpa pela noite passada, procurando constantemente uma confirmação, um perdão, de que ele poderia partir sem deixar mágoas com ela para trás. Eu particularmente senti como se desde o primeiro momento essa viagem sempre foi uma despedida, um adeus, ele queria que ela tivesse boas últimas lembranças dele, assim como à última dança. Os flashbacks intercalam entre a lembrança da última dança quando ela era criança, e a cena de uma balada onde os dois evidentemente parecem brigar. Na minha percepção, aquela cena foi como a Sophie se sentiu após a tragédia, ela sentiu raiva por ele a ter deixado, e ao mesmo tempo sentia uma saudade indescritível assistindo aos vídeos da viagem.
Simplesmente o peso das dores de uma memória.