O filme “Whiplash” (2014) por João Paulo Meneses

O filme “Whiplash” (2014) por João Paulo Meneses

Um estudante sonhador e determinado a alcançar a excelência naquilo que mais ama fazer (tocar bateria), entra na melhor escola de música dos Estados Unidos, e se depara com aquele que pode vir a ser seu melhor aliado, ou a pior coisa que poderia acontecer em sua vida: seu professor. Essa é a premissa (deveras resumida) de Whiplash, dirigido e roteirizado por Damien Chazelle, e protagonizado por Miles Teller (que faz Andrew Neiman) e J. K. Simons (que interpreta Terence Fletcher).

Andrew é um personagem focado e obstinado em seu objetivo, ao mesmo tempo também é inseguro e tímido. Ele faz parte de uma banda da própria escola, um tanto quanto amadora, e atua apenas como baterista reserva. Em um dia de prática intensiva, Fletcher decide observar seu treino e vai ao encontro dele. Esta é a primeira cena do longa, que demonstra a competência de Chazelle tanto na direção quanto no seu texto extremamente bem escrito. Em um outro dia, durante uma aula com sua banda, Fletcher invade a sala, e “convida” Andrew a sair de sua banda, e ir para a dele.

O seu semblante se transforma, ele ganha confiança, até chama uma garota para um encontro, vai dormir feliz e ansioso para sua primeira aula, marcada por Terence às 6h da manhã. Ele acorda atrasado, sai de casa desesperado para chegar o mais rápido possível, e quando entra na sala de aula, ela está vazia. Ele estranha, olha o informativo colado na parede de fora e vê que, na verdade, a aula está marcada para às 9h. Até esse momento a personalidade de Fletcher é apresentada para nós de forma branda, sabemos que ele é um renomado e rígido professor, mas nada além disso, porque na primeira aula, J. K. Simons rouba a cena e nos mostra quem é Terence Fletcher.

No decorrer da narrativa vemos diversos momentos explosivos e raivosos de Fletcher para com seus alunos. Ele não perdoa erros, seja uma nota desafinada ou um ritmo fora do compasso, absolutamente nada escapa de seu ouvido. Num primeiro momento, Andrew retorna com seu andar cabisbaixo e cheio de desmotivação, mas ao mesmo tempo, quanto mais Fletcher bate nele, mais ele ganha forças para praticar, até sujar suas mãos de puro sangue. Ele decide focar todos os seus esforços no seu sonho, e toma a iniciativa de romper o curto relacionamento com a garota que estava começando a conhecer.

Em um dado momento nos é revelada uma outra faceta de Fletcher. Ele entra na sala, coloca um vinil de jazz para todos ouvirem, e começa a contar a história de um aluno seu, história essa que o leva aos prantos, já que o solo da música era do aluno, que tinha falecido na noite passada. Esse momento me fez questionar, “ será que ele realmente gosta dos alunos mesmo os tratando tão mal? Será que de alguma forma ele acredita realmente que essa é a melhor forma de ensinar? ”, e era exatamente isso. Fletcher acreditava que era seu dever estimular os alunos daquela maneira, que era a única forma de formar novos gênios, de um estilo musical cada vez mais esquecido: o jazz.

Talvez a principal discussão que Whiplash traz a partir disso é: “até que ponto alguém é capaz de ir para alcançar a excelência? “. Isto é representado tanto pela vontade incansável de Andrew em se tornar uma lenda da bateria, quanto pela vontade de Fletcher de formar novos Buddy Rich’s, novos Louis Armstrong’s, novos Bill Evans’s. Whiplash beira a perfeição, desde a trilha sonora, elenco e direção, até o roteiro e a edição, mas é no seu clímax onde ele se mostra como um dos melhores filmes de todos os tempos.

Após ter sido demitido da escola por denúncias de ex-alunos (incluindo Andrew, que havia sido expulso por tê-lo agredido no palco), Fletcher “faz as pazes” com seu prodígio e o convida para tocar em uma apresentação de um festival, com o mesmo repertório da banda de sua escola. Andrew muito feliz decide ir, porém tem uma surpresa bastante desagradável: ele foi sabotado, e o repertório escolhido não é nada do que ele conhece. Terence sabe que ele foi um dos responsáveis pela sua demissão, e essa foi sua forma de se vingar, mas ele não contava que Andrew iria começar a puxar uma outra música e conduzir a banda a seu favor.

Aqui se inicia um duelo feroz entre mestre e pupilo, aliado à uma aula de direção e jogos de câmera espetaculares. Tudo brilha, tudo se destaca, tudo acontecendo na tela me levou a ficar com o queixo no chão, eu não sabia que uma sequência cinematográfica tão ágil e tão bem feita como essa era possível ser feita da forma como Damien Chazelle fez. E é  nesse ápice que o filme mais uma vez levanta o questionamento: até onde vale a pena se sacrificar pela perfeição? Essa dúvida não é respondida pelo longa, mas parafraseando o próprio protagonista, talvez seja melhor morrer aos 30 e ser lembrado por décadas como uma lenda, do que viver bastante e ser esquecido por todos.

por João Paulo Meneses